segunda-feira, 24 de setembro de 2012


Exclusão e Latifúndio: A Historia Fundiária Brasileira.

UMA HISTÓRIA PARA A PROPRIEDADE FUNDIÁRIA NO BRASIL

Com absoluta certeza a história do Brasil foi notoriamente marcada por uma estrutura fundiária baseada pelo latifúndio, pela rapina, e pela exclusão. A propriedade sempre foi motivo de disputas e como um principal fator para a existência de uma grande segregação social no país. Enfim, a estrutura agrária brasileira está profundamente ligada a uma aristocracia desde os primórdios da colonização. A terra foi distribuída de uma forma que, o surgimento de problemas sociais proveniente disso seria, com absoluta certeza, uma consequência notável, haja vista que, tal distribuição fundiária gerou consigo um grande processo de exclusão e uma abismal separação entre as camadas sociais. É essa propriedade agrária brasileira, que desde os remotos tempos da colonização, passou a se concentrar em torno da propriedade privada. Aumentando cada vez mais a dificuldade em se ter um pedaço de terra para dela desenvolver um trabalho. Uma vez que, a posse dessa terra era algo completamente ligado ao próprio status social que algum indivíduo pertencera. Nesse contexto pertencer às elites dominantes seria uma qualidade fundamental para a obtenção de uma propriedade no Brasil. Dentro dessa perspectiva, o debate a cerca da propriedade agrária no Brasil sempre foi um assunto gerador de inúmeras polêmicas, uma vez que, esta estrutura agrária implementada desde o período colonial, sempre obedeceu aos interesses da elite governante. E foi dessa maneira que a empresa agrícola implantada durante os primeiros anos de colonização, alicerçada no latifúndio e na exploração do trabalho, exerceu notável influencia na organização da sociedade, servindo como um potencial elemento motivador das desigualdades sociais dentro do espaço agrário brasileiro. 

1. AS ORIGENS HISTÓRICAS DO LATIFÚNDIO BRASILEIRO
Os primeiros anos de efetiva colonização portuguesa na América, acarretou na organização das terras brasileiras de acordo com os interesses na produção e a comercialização do açúcar, implantando assim o sistema das Capitanias Hereditárias e posteriormente a instalação dos primeiros engenhos. Visto que essa forma de geração de lucros por meio da monocultura se efetivou como uma economia bastante rentável para a coroa portuguesa, os engenhos, passaram a ser o núcleo principal da formação econômica dos tempos coloniais. A construção dessas unidades produtivas necessitavam de um notório investimento na infraestrutura das instalações para a produção do açúcar. Ou seja, a grande lavoura era uma condição fundamental para se consolidar um investimento real na cultura da cana-de-açúcar. Segundo Caio Prado Júnior (1993): A cultura da cana somente se prestava, economicamente, as grandes plantações. Já para desbravar convenientemente o terreno (tarefa custosa neste meio tropical e virgem tão hostil ao homem) tornava-se necessário o esforço reunido de muitos trabalhadores; não era empresa para pequenos proprietários isolados. Isto feito, a plantação, a colheita e o transporte do produto até os engenhos onde se preparava o açúcar, só se tornava rendoso quando realizado em grandes volumes. Nestas condições, o pequeno produtor não podia subsistir (p. 36). Diante de tal contexto, a instalação desses engenhos representou de fato, a formação das primeiras propriedade de terra no Brasil, e assim, o latifúndio foi se cristalizando cada vez mais na conjuntura econômica brasileira. Além disso, dentro da própria conjuntura da monocultura da cana-de-açúcar, é valido ressaltar que a existência de relações sociais marcadas por um teor patriarcal e autoritário passa a ser um predicado inerente a figura da aristocracia rural brasileira. Essas características de fato é algo de singular relevância para um maior entendimento do presente estudo. É o engenho, ou segundo Caio Prado Junior, "propriedade canavieira" o elemento fundamental para chegarmos a um entendimento sobre a formação fundiária no Brasil. Uma vez que, todas as estruturas investidas naquela grande extensão territorial, como a casa grande, senzala, moenda, casa de purgar, além de estrebarias e áreas de pastagens, representavam de forma clara, que os meios de produções estavam nas mãos de uma elite aristocrática. O engenho, de fato, representava o centro da vida econômica e social. Baseado em uma grande extensão de terras e de produção autônoma, produziam praticamente tudo o que consumiam. No período compreendido entre o século XVI e início do século XVII, os engenhos brasileiros foram os que mais produziam o açúcar do mundo. A sociedade açucareira era aristocrata, patriarcal, rural, escravista e principalmente marcada por um notório imobilismo social. A autoridade do senhor de engenho fazia-se presente junto à sua família, aos empregados, aos escravos e até às vilas próximas à sua propriedade. Além disso, eram os senhores de engenhos que controlavam as câmaras municipais e a vida política local. Nesse sentido essa sociedade foi estruturada em um rigoroso sistema de classes, apresentando como classes dominantes: uma aristocracia rural, comerciantes e uma nobreza burocrática ligada ao governo português, essas camadas sociais detinham em suas mãos, todo o poder político e econômico da colônia. E na base da pirâmide social da colônia, temos um numeroso contingente de escravos de origem africana em sua maioria, que representavam literalmente a mão de obra ativa desse período. Diante disso, o mandonismo é tido como um traço marcante, no que se refere às relações sociais inseridas nesses espaços. E esses fatores influenciaram notoriamente a formação social do Brasil. A figura do senhor de engenho vai se configurar como uma influencia marcante na configuração de uma sociedade elitista, autoritária e com grandes desigualdades sociais. Nesse contexto, temos uma relação direta entre a vida dentro dos engenhos e o processo de formação da sociedade colonial. "A Grande Propriedade Açucareira é um verdadeiro mundo em miniatura em que se concentra e resume toda de uma pequena parcela da humanidade" (PRADO JUNIOR, 1993, p. 38). O objetivo que se pretende chegar com o presente raciocínio é reflexão sobre a influência que a monocultura da cana-de-açúcar teve na consolidação da grande extensão de terras dentro do território brasileiro e a existência de uma aristocracia agrária detentora das forças produtivas, desde o século XVI. Uma vez que, sem grandes concentrações de capital, as terras praticamente não tinham valia econômica (FURTADO, 1997). Ou seja, era preciso um grande investimento para o surgimento desses engenhos, investimentos esses que somente tinham validade se por meio da grande extensão de terra. Segundo João Pedro Stédile: Ao longo do período colonial e até as primeiras décadas do império, esse sistema permaneceu: a terra era um bem da coroa, que concedia a posse àqueles que considerassem merecedores dela. Com o tempo e o aumento da população e, principalmente, depois da instalação da Corte portuguesa no Brasil, em 1808, a extensão das terras concedidas foram diminuindo, mas mantinham-se, ainda as proporções gigantescas, se levarmos em conta os parâmetros atuais de propriedade de terra. Em geral, os limites da propriedade eram definidos obedecendo-se apenas a acidentes geográficos, usando-se a légua como medida básica. (1997, p.09). Como podemos avaliar, a questão fundiária é um traço de grande relevância, quando se pretende analisar as causas primeiras das lutas do campesinato brasileiro. Uma vez que, é dentro da distribuição de terras no Brasil que se encontra grande parte dos problemas, não só, ligados aos camponeses ou trabalhadores rurais, mas também a problemáticas sociais do próprio país. 

2. A GRANDE PROPRIEDADE E O IMPÉRIO BRASILEIRO
 Se o modelo de grande concentração de terras, ligados a monocultura da cana-de-açúcar foi de fato um traço marcante no período colonial. Séculos depois, mesmo após o processo de independência do Brasil, ainda constatamos a predominância de mecanismos que ainda mantém o status quo, e consequentemente a manutenção de tais desigualdades sociais. E o melhor exemplo desse fato, é a criação da primeira lei brasileira sobre a questão fundiária. Conhecida como a Lei de Terras no período outorgada no período imperial. Visando promover um ordenamento jurídico na propriedade agrária, foi criada a Lei Imperial n. 12, de 18 de setembro de 1850, conhecida como Lei de Terras e teve a sua posterior regulamentação em 1854. A propriedade que não estava registrada em cartório era considerada devolutas e pertenceriam exclusivamente ao Estado brasileiro, chegando até mesmo a condenar qualquer forma de invasão ou ocupação clandestina dessas terras, prevendo sansões como multa e prisão. De acordo com a lei, eram consideradas devolutas as terras que não fossem aplicadas a utilização pública nacional, provincial ou municipal. Como também, as que não se configurarem como propriedades particulares reconhecidas por títulos cartoriais, até mesmo as sesmarias ou concessões do Governo Geral ou provincial ou as posses de efetivo desenvolvimento de cultura e moradia do posseiro que fora regularizada pela própria lei. O fato é que, tendo em vista, o contexto histórico e econômico do capitalismo industrial no mundo, essa realidade chega ao Brasil e a Lei de Terras, almeja organizar a propriedade privada brasileira por meio de regulamentações diferentes das utilizadas no período colonial, onde as concessões de utilização da propriedade agrária vinha das ordens da figura do rei. Houve uma necessidade de adequar a propriedade fundiária ao expansionismo capitalista, uma vez que, havendo a definição somente de terras públicas, particulares e devolutas, essas últimas, poderiam ser vendidas a particulares a qualquer momento. Fato esse que está claro no Artigo 1º da referida lei que determina a proibição de aquisições de terras devolutas no Brasil, por outro titulo que não seja o de compra. Consequentemente, vamos identificar uma exclusão direta sobre uma camada de famílias camponesas, haja vista, a exigência feita pelo governo imperial para a obtenção de uma propriedade da terra ser exclusivamente por meio da compra. Essa única forma de se ter acesso legalizado a terra, com absoluta certeza, se configura também como um grande mecanismo de exclusão social à propriedade agrícola. Sabe-se que a atenção principal do presente estudo não é uma abordagem técnica e historicista sobre a Lei de Terras, mas, devido a relevância da temática principal abordada na pesquisa, tal análise, contribui bastante para uma maior reflexão sobre a questão agrária presente na história do Brasil, tendo como a referida lei como uma mantenedora da histórica realidade latifundiária e exclusivista brasileira. João Pedro Stédile refere-se à Lei de Terras: Essa Lei discriminou os pobres e impediu que os escravos libertos se tornassem proprietários, pois nem uns nem outros possuíam recursos para adquirir parcelas de terra da Coroa ou para legalizar as que possuíam. Por essa razão, após a libertação dos escravos, a maior parte deles optou por migrar para cidades como Rio de Janeiro, Salvador e Recife, em vez de permanecer nas fazendas ou nas pequenas vilas do interior. Uma vez nas cidades, sem opção de moradia e de trabalho, formaram vilas paupérrimas, sobrevivendo à custa do subemprego ou da mendicância (1997, p. 11). A consequência social dessa lei foi a maior consolidação do latifúndio como estrutura básica da distribuição de terras no Brasil. Aqueles que tinham recebido as sesmarias regularizaram suas posses e transformaram-nas em propriedade privada, assegurando, assim, o domínio da principal riqueza do país: suas terras. 

3.
MODERNIZAÇÃO E EXCLUSÃO EM TERRAS BRASILEIRAS
Ao prosseguirmos sobre esse breve estudo sobre a realidade fundiária brasileira, chegamos ao século XX, partindo de uma leitura baseada no momento de efetiva modernização capitalista dentro das áreas rurais brasileiras. Pois bem, no debate sobre a propriedade rural nesse período encontramos um notável paradoxo social devido ao modelo de produção modernizada por meio da penetração do capital na agricultura, conduzindo inexoravelmente á separação do produtor direto da terra e dos frutos de seu trabalho. (AZEVÊDO, 1982, p.19). Pois bem, ao haver essa modernização na produção agrícola, a acumulação do capital será um fator predominante no processo de expropriação das terras, devido ao surgimento das grandes usinas. Modificando principalmente as relações de trabalho e fazendo surgir uma camada de trabalhadores assalariados e com isso, acarretando em uma "marginalização" desses trabalhadores, uma vez que, ao haver essas mudanças, as terras que antes os camponeses utilizavam para o sustento de suas famílias, foram sendo confiscadas pelos donos dos engenhos devido à busca pelo aumento da produção agrária. É válido prestarmos uma atenção maior a uma existente modificação de status social. O camponês se torna um trabalhador assalariado (característica tipicamente do capitalismo), a sua subsistência será concretizada, não pelo seu trabalho direto em pequenas propriedades arrendadas a eles, mas agora pela sua força de trabalho desenvolvida em troca de uma remuneração salarial. A partir daí, a ideologia política presente nas áreas rurais, passa por uma releitura e por uma nova análise, pois os trabalhadores rurais empregados em engenhos fornecedores de cana-de-açúcar ou em propriedades ligadas a usinas, por geralmente não ter sido contemplado com nenhum direito trabalhista assegurado, terá como principal luta política, a criação de um corpo de leis trabalhistas, silenciando a luta maior, o acesso a terra. Nesse momento passa a existir duas categorias: a primeira consiste nos trabalhadores rurais assalariados que se encontram diretamente ligado as relações de trabalho capitalista e uma segunda classe de camponeses que, segundo VENDRAMINI (2008) "está submetida indiretamente ao capital, formalmente preserva a sua autonomia e aparenta trabalhar para si mesmo, mas na realidade depende do capital financeiro, comercial e industrial". Logo, essas duas classes distintas, apesar de estarem no mesmo bojo das classes exploradas pelo capital, manifestam nas suas intenções políticas com finalidades diferentes. Ficando claro as modificações ocorridas nas relações de trabalho, enfraquecendo assim, o movimento camponês. É válido ressaltar que a modernização na produção agrícola ligada ao processo usineiro seguia o método denominado de "Via Prussiana" no qual, segundo Lênin, "o capital penetra no campo mantendo a grande propriedade agrária e o monopólio da terra, a partir de onde promove a modernização agrária e as transformações das relações sociais atrasadas e arcaicas" (apud AZEVÊDO, p. 21). É nesse modelo prussiano que vai haver uma aliança entre os latifundiários do Nordeste brasileiro junto a uma burguesia industrial (usineiros), que com as suas novas técnicas de produção, vão "invadir" a produção agrícola e provocar as mudanças nas relações de trabalho das áreas rurais, ou seja, a transformação de camponeses em trabalhadores rurais assalariados. Mudanças essas que são marcadas profundamente pela manutenção da exclusão política do campesinato. Em outras palavras, atribui a esse modelo de desenvolvimento uma modificação na forma de se produzir, sem eliminar o mandonismo coronelista, mantendo, assim vários aspectos da política local. E nessa conjuntura, podemos identificar nesse momento, uma modernização produtiva, mantendo as formas de exploração do trabalho, não havendo assim, nenhuma modificação concreta na representação do patronato das regiões agrárias, prevalecendo ainda a antiga representação do autoritário senhor de engenho. A região nordeste é um retrato fiel de tal realidade, que de maneira clara mantém notória desigualdade social. A manutenção de uma relação baseada no mandonismo local é uma herança histórica presente nas áreas rurais brasileiras e nem mesmo a modernização da produção dentro dessas regiões conseguiu modificar essa realidade. Pelo contrário, com uma maior complexidade dentro das relações de trabalho no campo, haja vista, a presença de novas formas de trabalho, com o surgimento do assalariado rural, dificultou o acesso das famílias camponesas à terra e a liberdade. Assim, os antigos engenhos "banguês" aos poucos eram substituídos pela modernização das usinas e se tornando os assim denominados de engenhos de "fogo morto", ou seja, propriedades fornecedoras de cana-de-açúcar para as grandes usinas que representavam diretamente todo esse desenvolvimento agrário industrial. Ora sabe-se que as relações de trabalho no Nordeste estavam totalmente restritas a conjuntura latifundiária local, foi nessa ocasião que mesmo tendo consideráveis modernizações, havia um "pacto agrário" que mantinha a famosa "paz agrária", ou seja, a manutenção sobre às formas de exploração e de exclusão política para os camponeses e camadas populares. Tendo em vista, essas modificações, a exploração do campesinato tende a aumentar cada vez mais, uma vez que, agora a verticalização do poder local não está somente restrito aos "barões de açúcar" (esses por sua vez, ainda mantinha a sua influencia sobre as vidas camponesas), mas também a uma burguesia industrial que tratara de expandir o trabalho assalariado por toda área rural. Nessa conjuntura, os desmandos e a exploração ao trabalhador transformam o espaço agrário brasileiro em um "barril de pólvoras" prestes a explodir, por meio de uma reação camponesa devido a constante expropriação de terras, motivadas pela necessidade de expansão das lavouras de cana-de-açúcar para que ocorresse um aumento no fornecimento de matéria-prima para as usinas produtoras. Esse processo foi concretizado de uma forma bastante clara, tornando o trabalhador rural como uma mercadoria exclusiva para a serventia ao capital. Formando assim uma ótica industrial dentro da própria lavoura. A partir desse momento, o trabalhador rural será diretamente separado da própria produção e dos instrumentos de trabalho. Havendo uma super exploração, paralelo ao pagamento salarial totalmente inferior ao soldo mínimo regional. É válido ressaltar que, os direitos trabalhistas, nessa conjuntura quase que inexistia na concepção das mentes camponesas, uma vez que, apesar de aos poucos uma considerável maioria de camponeses estivessem passando por profundas mudanças no seu cotidiano, se aproximando cada vez mais do próprio proletariado urbano, essa população rural, primeiramente, ainda não estava pronta para sofrer uma mudança tão radical, tendo em vista a secularidade das suas antigas relações de trabalho e produção. Sendo assim, quando o assalariado rural passa a se tornar a classe popular mais numerosa, não vai haver um "proletário rural" organizado e crítico aos seus direitos trabalhistas. É fato que a história do latifúndio brasileiro vai ter no século XX um crescimento ainda maior com a chegada das usinas nas áreas rurais, mantendo de um lado a estrutura fundiária e ampliando ainda mais a exploração do trabalho. Podemos assim então refletir que cabia apenas ao camponês apenas duas saídas. A primeira consistia em simplesmente se adaptar as novas regras de uma economia de mercado no campo, se tornando na melhor das hipóteses um trabalhador assalariado não contemplado por direitos trabalhistas (é válido ressaltar que nesse processo de adaptação do trabalhador as novas formas de produção regida pela burguesia industrial, foram constatadas um grande contingente de famílias marginalizadas, devido a grande utilização da mão de obra temporária. Assim, ser um assalariado fixo em no latifúndio rural, mesmo sem ter algum direito trabalhista, a partir da década de 1960 ainda era um privilégio de poucas famílias.). Como uma segunda alternativa que seria se manifestar antagonicamente a essas mudanças na produção capitalista que cada vez mais expropriava terras das pobres famílias camponesas migrando para áreas urbanas, sendo vítima, também da exploração e da exclusão social. Marlene Ribeiro, ao relatar sobre a caracterização do campesinato brasileiro, ressalta sobre a relação entre agricultura e industrialização, tendo em vista as mudanças nas relações de trabalho proveniente de tal processo, surgindo assim uma heterogeneidade de sujeitos históricos dentro das áreas rurais como: trabalhadores assalariados, trabalhadores assalariados temporários, arrendatários, meeiros, produtores integrados a agroindústria e produtores familiares que passam a viver com grandes empresas agrícolas, de modo que não podemos, ao falar do camponês, ou do trabalhador rural, ou do trabalhador da terra, ter mente uma situação homogênea (RIBEIRO, 2010). De fato, nesse momento histórico, o meio rural irá contar com uma pluralidade de formas e de relações de trabalhos, entretanto, a luta pelo acesso a terra é um fator comum a todas essas novas formas de relações de trabalho. A questão é que tais mudanças introduzidas ao campo modificaram as bases de produção dentro das áreas rurais do Brasil, sem modificar em nenhum momento a estrutura fundiária presente. Pelo contrário, a história da concentração de terras aumenta cada vez mais, se consolidando como um efetivo problema político, ressaltado até na assembleia constituinte de 1946, no que diz respeito ao conceito da utilização social da terra para produção, defendido pelo senador Luís Carlos Prestes do PCB. A implementação das primeiras usinas e dos engenhos centrais (propriedades pertencentes a empresas) que compravam a produção de outros engenhos fornecedores para a posterior produção do açúcar vai se tornar um problema social grave, principalmente devido às expropriações (diretas e indiretas) de terras, paralelo a exploração do trabalho, principalmente na região Nordeste. Mesmo os preceitos constitucionais que trariam o debate sobre o uso social da terra não vão surtir efeitos concretos para os trabalhadores rurais e para os camponeses pobres. Ocorrendo assim, o surgimento de alguns movimentos sociais, alinhados por ideologias ligadas as ligas camponesas, a setores da igreja católica ou a partidos políticos, que eram os principais instrumentos de denúncia sobre os problemas sociais presentes nas áreas rurais que historicamente se acumulavam, devido a inexistência de uma política governamental. De certo modo, o estímulo ao capitalismo dentro da produção agrícola, somente contribuiu para a defesa da grande propriedade agrícola e para o entreguismo econômico brasileiro ao capital estrangeiro. Conjuntura essa que se fortaleceu cada vez mais a partir do golpe militar ocorrido em 31 de março de 1964, que afastou cada vez mais o sonho de uma reforma agrária, como também silenciou os trabalhadores e camponeses organizados. Em relação aos movimentos sociais dos camponeses e a luta pela terra, os regimes militares introduziram a paz dos cemitérios. As principais organizações de camponeses foram proibidas, e seus líderes, quando não escaparam para o exílio, foram presos ou assassinados. Centenas de lideranças camponesas foram duramente perseguidas pelos militares, latifundiários e pelas oligarquias do campo, que passaram a atuar livremente. O debate político, científico e acadêmico também foi silenciado com o peso dos coturnos (STÉDILE, 2002, p. 16). De acordo com o que foi relatado, podemos avaliar que mesmo com toda uma modernização da agricultura, principalmente no século XX, não havia nenhum interesse em modificar as relações sociais e a propriedade erguida historicamente no país. As mudanças ocorridas serviam diretamente aos interesses das camadas sociais mais ricas, junto as ações de empresas multinacionais. Após o final dos regimes militares e ressurgimento dos movimentos sociais, o debate sobre uma possível reforma agrária contrária ao latifúndio e as desigualdades sociais nas áreas rurais passaram a ganhar um espaço maior, entretanto, com avanços políticos bastante débeis. Uma vez que, o saldo da propriedade de terra no Brasil ainda condiz as suas estruturas históricas. Mesmo com a extensão continental, o território brasileiro chega no ano de 1990 como o segundo país do mundo em nível de concentração da propriedade da terra, segundo os índices das Nações Unidas, por meio dos seus organismos responsáveis pela análise da agricultura e alimentação mundial. Ainda persiste a predominância de grandes propriedades pertencentes a poucas famílias, enquanto mais de 3 milhões de pequenos proprietários possuem menos de 10 hectares de terras. São essas oligarquias rurais que desde os tempos coloniais controlam grande parcela dos hectares brasileiros e faz com que o acesso a essas terras pelas famílias camponesas pobres torna-se, praticamente uma utopia. Além da elite latifundiária, ainda encontramos a presença de grupos econômicos e empresas estrangeiras que desde a década de 1960 investem grandes quantias financeiras na compra de fazendas consolidando cada vez mais uma realidade latifundiária no meio rural brasileiro. Fato esse citado por STÉDILE (2000) como uma 'megalomania' rural entre as elites brasileiras que ainda identificam projeção social e prestígio político com a posse de grandes áreas de terra, mesmo que elas não sejam sua principal fonte de renda ou sequer exploradas economicamente. 
REFERÊNCIAS 
ANDRADE, Manuel Correia. Lutas Camponesas no Nordeste. 2. ed. São Paulo: Ática 1989.
AZEVÊDO, Fernando Antônio. As Ligas Camponesas. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. BRASIL. Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850. Sítio eletrônico internet: . Acesso em: 20 jun 2010.
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. 26. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1997.
PRADO JUNIOR, Caio. História Econômica do Brasil. 40. ed. São Paulo: Brasiliense, 1993.
RIBEIRO, Marlene. Movimento Camponês, trabalho e educação: liberdade, autonomia, emancipação: princípios/fins da formação humana. São Paulo: Expressão Popular, 2010.
STÉDILE, João Pedro. A Questão Agrária no Brasil. 10 Ed. São Paulo: Atual, 1997.

Área de Rio Grande = 2.813,907 km2

Uma (1) légua = entre 4 e 7 km.

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