sábado, 16 de junho de 2012

TERRITÓRIO, SABERES E DIREITO DE POPULAÇÕES TRADICIONAIS

Território, saberes e direito de populações tradicionais.

No plano internacional, os países industrializados têm procurado frear o processo de reconhecimento de direitos a populações tradicionais sobre a biodiversidade, estas que sabidamente mais contribuem para a conservação dos recursos biológicos. Até mesmo, passados mais de cinco anos da Conferência do Rio, onde se consagrava o debate a propósito da Convenção sobre a Diversidade Biológica, ainda não existe nenhum instrumento legal e efetivo de defesa do conhecimento das populações tradicionais. Os países mais ricos e com o controle da tecnologia têm pressa em aprovar normatizações sobre a tecnologia, como também a Lei de Patentes que estabelece a proteção e o acesso às novas tecnologias, por meio do sistema de propriedade intelectual. [...] Estamos diante de uma questão ética que é reconhecer não somente que as comunidades tradicionais precisam ter seus saberes protegidos, mas também garantir o sistema de produção desses saberes. É essa a grande questão, pois o processo de transformação por que passam hoje as sociedades com o avanço tecnológico põe em perigo a própria validação desse sistema cultural. [...] O que no fundo está em jogo é o direito de essas populações manterem vivo um outro conceito de conhecimento e de inovação. Trata-se de um campo novo do direito, em constituição, que deve regular os direitos dessas populações a manter seus sistemas de conhecimento não redutíveis ao sistema tecnocientífico. [...] Exercer a soberania sobre os recursos biológicos, preconizada pela Convenção sobre a Diversidade Biológica, passa pela proteção dos componentes tangíveis e intangíveis da biodiversidade, pois é fundamental levar em conta tanto a bio como a sociodiversidade e a relação entre elas. [...]

É necessário acompanhar as regulamentações sobre o acesso a recursos genéticos por grupos econômicos de países industrializados e a proteção do conhecimento acumulado sobre os ecossistemas pelas populações tradicionais. Estes grupos, ao conceber a terra como um bem comum, obedecem a regras definidas nos cânones do direito consuetudinário, historicamente fundador de sua territorialidade. A discussão sobre as bases dessa territorialidade, portanto, não poderia jamais caber no âmbito limitado do direito privado.

Adaptado de: CASTRO, Edna. Território, Biodiversidade e Saberes. In: DIEGUES, Antônio Carlos. (Org.). Etnoconservação: novos rumos para a proteção da natureza nos trópicos. São Paulo: Hucitec, Nupaub-USP, Annablume, 2000. p. 173-175

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